O Canal de Suez, desconhecido por muitos se tornou um dos assuntos mais comentados nas conversas fiadas diárias. O canal é a rota mais importante do mundo para o transporte de produtos entre o oriente e o ocidente, sendo o caminho mais curto e o mais rápido. Criado pelo governo do Egito, o canal teve um custo multimilionário, mas também é uma das principais fontes de renda do país, ou era.
Entrou Areia
Uma tempestade de areia, comum no clima desértico do Egito foi responsável por encalhar o meganavio cargueiro Ever Given. O cargueiro estava lotado de contêineres com os mais variados conteúdos e encalhou no canal, ficando na transversal, não só impedido de seguir, mas também bloqueando a passagem das demais embarcações. A partir daí começaram as previsões catastróficas com relação ao prazo de desencalhe, elas iam de uma semana à um ano no cenário mais tenebroso e especulativo. Essa demora não seria prejudicial somente para as empresas de transporte e o governo do Egito, mas repercutiria em toda a economia global, que já anda cambaleando graças às despesas causadas pela pandemia que já se arrasta há mais de um ano na maioria dos países.
Considerando o impacto que um fenômeno natural, razoavelmente comum naquela área, teve no mundo todo, te convido a refletir: será que tudo depende de fato de você? Girando o globo terrestre e aterrissando aqui em terras tupiniquins temos uma realidade brutal cada vez mais latente, com as medidas restritivas tardias e insuficientes, aliadas às instabilidades políticas presentes desde o início do governo atual e a propaganda de combate às medidas preventivas feita pelo próprio governo se formou um cenário dramático com desemprego em alta, hospitais superlotados com casos de Covid e uma parcela significativa da população indiferente aos perigos de ignorar a pandemia. Com a prolongação da crise na saúde o desamparo econômico em que a população se encontrava no início da pandemia se estabeleceu e trouxe para a rotina brasileira escolhas difíceis no mercado, empregos precários e desemprego latente, assim como uma realidade que não assombrava o país há tempos: a miséria.
Em um cenário tão aterrador gerado por fatores externos, mesmo que alguns sejam consequências das escolhas mal pensadas, o papel do indivíduo se torna muito irrisório frente à tempestade de areia que caminha em sua direção. Agora, se nem um meganavio, que possuía um corpo técnico todo voltado para promover o desencalhe, conseguiu sair da areia em pouco tempo, como uma pessoa conseguiria? A vida na sociedade atual se assemelha muito ao cenário visto no Canal de Suez ao longo dos últimos dias. Enquanto o ciclo precisa continuar, a vida precisa andar, uma tempestade causa estagnação. A forma de lidar com essa tempestade pode ser representada pelo próprio Ever Given, que impede o caminho dos outros cargueiros. Enquanto os navios tentam seguir o fluxo marítimo, um meganavio se põe atravessado.
No caso do Ever Given a situação se resolveu em menos de uma semana, mas no paralelo que fazemos com a realidade da pandemia aqui no Brasil, o navio segue atravessado, impedindo o fluxo e trocando equipe técnica com uma frequência maior que a mudança das marés. Enquanto isso, os demais continuam à deriva vendo uma retroescavadeira insignificante fazer cócegas no navio que insiste em se manter no caminho.
Odisseia Boêmia 